Sobre o espírito de um relógio cuco_uma reflexão acerca do luto e da reparação a partir do pensamento benjaminiano
Par Andrea • 7 Mai 2018 • 952 Mots (4 Pages) • 616 Vues
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O que parece, por fim, determinar e unir estas personagens é o sentimento comum da espera. Espera pelo acontecimento trágico e fatal da morte, e, assim, pelos desdobramentos que ele possa trazer à vida daqueles que o presenciam, estáticos, como pegos de surpresa. A sucessão dos instantes seguintes à queda são silenciosos e paralisantes, nada dizem sobre a morte e retiram do horizonte de cada personagem qualquer possibilidade de que o acontecimento se resolva. O corpo em queda se impõe e o acontecimento de morte é suspenso. O fim, única certeza imputada ao corpo físico, é posto no horizonte das expectativas de cada uma das personagens, e sob sua iminência, misteriosamente hesita em se concretizar. A agonia da espera pelo instante que será decisivo na vida de alguém reverbera na história de cada personagem, e esta, na dinâmica de sua vida interior, abre-se em abismo, verticalidade composta de vazios, incertezas e inseguranças, lugar onde habita em movimentos circulares o corpo desconhecido em queda. Neste impasse, “Poema suspenso para uma cidade em queda” revela nossa carência infantil frente à solidão da vida a sós. E a necessidade de constituir vínculos. Relações humanas que se fazem cordas e presilhas para evitar a queda. Cordão umbilical, faixa sobre o ventre, esparadrapo para puxar os olhos, cuecas várias para que a mala não se arrume jamais, e por fim a plateia e o ator... último vínculo possível para que as próprias personagens possam escapar da vertigem angustiante de uma encenação sem fim. Escape dos espaços vazios preenchidos pelo tempo da solidão, a plateia se torna última ligação entre as horas, os minutos, de incerteza, de espera, de desejo, medo e de frustrações dos tantos poetas suspensos sob uma cidade, um país, sob um mundo em queda.
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